31 de boca
31 de boca
Thursday, January 15, 2015
Thursday, February 18, 2010
Sunday, May 10, 2009
15.
Já carpi, já queixei, já contaminei, já remoí, já sofri e fiz sofrer. Chegou a altura de me resignar, *positivamente* resignar-me e consolar-me dignamente: palavra a palavra, sopro a sopro a plenos ou médios pulmões, mas a alma inteira. Sopro a sopro, palavra a palavra, gesto a gesto e, porque não, sorriso a riso e de novo a sorriso aligeirado, exalando o hálito sereno e fresco da minha alma.
Friday, May 25, 2007
14
"Como se escrevesse só para uma pessoa."
Espreitou pelo olho direito, turvo, o que há-de ver.
"Ou escrevo só para mim... ou para ninguém."
Mirou atentamente e percebeu que o que há-de vir confunde-se com o que há-de ver num olho turvo.
De sobressalto, num sobressalto lembrou-se da necessidade de mitigar o desejo de viver mais.
"Refrear o desejo, matar a esperança, dominar o medo."
E é como se escrevesse só para uma pessoa. Só. Para mim. Para ninguém.
Suspirou. Soprou sobre si mesmo como se apagasse uma vela.
Anulou-se.
"Como se escrevesse."
"Como se escrevesse só para uma pessoa."
Espreitou pelo olho direito, turvo, o que há-de ver.
"Ou escrevo só para mim... ou para ninguém."
Mirou atentamente e percebeu que o que há-de vir confunde-se com o que há-de ver num olho turvo.
De sobressalto, num sobressalto lembrou-se da necessidade de mitigar o desejo de viver mais.
"Refrear o desejo, matar a esperança, dominar o medo."
E é como se escrevesse só para uma pessoa. Só. Para mim. Para ninguém.
Suspirou. Soprou sobre si mesmo como se apagasse uma vela.
Anulou-se.
"Como se escrevesse."
Thursday, November 24, 2005
13.
A solidão que nos acompanha.
“Não se pode pensar mais nada sobre a solidão porque tudo já foi pensado. Mais nada pode ser dito porque já tudo foi dito.”
“Amas-me?”, ouviu num filme. “Sim, amo-te.”
Sentiu-se nu. Mais: sentiu-se escalado como peixe para secar, todo por/para fora, nada por/para dentro.
“Como voltar a mim mesmo se não sou refúgio? Quem me abriga?
Caramba! Já nem a solidão me acompanha.”
Vestiu o casaco para se resguardar do frio que lhe poisou nos ombros.
A solidão que nos acompanha.
“Não se pode pensar mais nada sobre a solidão porque tudo já foi pensado. Mais nada pode ser dito porque já tudo foi dito.”
“Amas-me?”, ouviu num filme. “Sim, amo-te.”
Sentiu-se nu. Mais: sentiu-se escalado como peixe para secar, todo por/para fora, nada por/para dentro.
“Como voltar a mim mesmo se não sou refúgio? Quem me abriga?
Caramba! Já nem a solidão me acompanha.”
Vestiu o casaco para se resguardar do frio que lhe poisou nos ombros.
Tuesday, September 16, 2003
12.
Fotografias.
Fotografias antigas.
Tocou-as e deixou escorregar as mãos pelo papel duro. Mergulhou na tinta desbotada. Memória esbatida do passado.
“A tinta é presente, o papel, duro, é presente. Só a memória é passado.”
Pousou a fotografia no braço do sofá e passou a mão pela cabeça. Duas vezes. Como quem quer escorregar as mãos pela memória.
Os olhos humedeceram. Nostalgia.
“O papel. A tinta. O presente.”
Agarrou duas fotos. Quase as amarfanhou. Passou-as no scanner e viu-as no monitor.
Deixou escorregar, agora, os olhos no écran. Mergulhou na memória do passado, fugindo da tinta e do papel. Depressa sufocou.
“Que disparate! És um parvalhão! E já andas a repetir muitas vezes este insulto…”
O plástico e o vidro do monitor caíram-lhe em cima com o peso de mais de vinte e cinco anos.
Esmagaram-no.
Fotografias.
Fotografias antigas.
Tocou-as e deixou escorregar as mãos pelo papel duro. Mergulhou na tinta desbotada. Memória esbatida do passado.
“A tinta é presente, o papel, duro, é presente. Só a memória é passado.”
Pousou a fotografia no braço do sofá e passou a mão pela cabeça. Duas vezes. Como quem quer escorregar as mãos pela memória.
Os olhos humedeceram. Nostalgia.
“O papel. A tinta. O presente.”
Agarrou duas fotos. Quase as amarfanhou. Passou-as no scanner e viu-as no monitor.
Deixou escorregar, agora, os olhos no écran. Mergulhou na memória do passado, fugindo da tinta e do papel. Depressa sufocou.
“Que disparate! És um parvalhão! E já andas a repetir muitas vezes este insulto…”
O plástico e o vidro do monitor caíram-lhe em cima com o peso de mais de vinte e cinco anos.
Esmagaram-no.
Saturday, August 23, 2003
11.
Olho de peixe.
O olho de peixe olha o vazio.
“Olha-me.”
Olha. Negro. Morto.
No mercado.
Uns desalinhados, outros a monte, os peixes olham, focando o infinito, olham as notas e moedas que lhes passam por cima. As mãos tocam-se e o dinheiro passa.
Olhou o olho do peixe. Por detrás do olho, negro, está o peixe. Morto.
Uma criança chora. Perto. Olhou os olhos da menina.
“Os olhos dos peixes não choram. Ou choram?”
Afastou-se.
“Há qualquer coisa de sábio na escuridão dos olhos dos peixes. Mortos. Há uma luz…negra. Que sabem eles?”
Aproximou-se doutra banca.
“Vieram do mar. Há mar e mar, há ir e voltar… Que sabem eles da morte?”
Quis saber: olhou um olho de peixe. O olho do peixe.
“Vai-se. Mas da morte não se volta, palerma.”
De repente chegou um cheiro desagradável. Como um arrepio na nuca ressuscitou-lhe os sentidos.
“Queres experimentar a morte enquanto ainda experimentas a vida… És um parvalhão!”
Foi-se embora.
Olho de peixe.
O olho de peixe olha o vazio.
“Olha-me.”
Olha. Negro. Morto.
No mercado.
Uns desalinhados, outros a monte, os peixes olham, focando o infinito, olham as notas e moedas que lhes passam por cima. As mãos tocam-se e o dinheiro passa.
Olhou o olho do peixe. Por detrás do olho, negro, está o peixe. Morto.
Uma criança chora. Perto. Olhou os olhos da menina.
“Os olhos dos peixes não choram. Ou choram?”
Afastou-se.
“Há qualquer coisa de sábio na escuridão dos olhos dos peixes. Mortos. Há uma luz…negra. Que sabem eles?”
Aproximou-se doutra banca.
“Vieram do mar. Há mar e mar, há ir e voltar… Que sabem eles da morte?”
Quis saber: olhou um olho de peixe. O olho do peixe.
“Vai-se. Mas da morte não se volta, palerma.”
De repente chegou um cheiro desagradável. Como um arrepio na nuca ressuscitou-lhe os sentidos.
“Queres experimentar a morte enquanto ainda experimentas a vida… És um parvalhão!”
Foi-se embora.
Subscribe to:
Posts (Atom)